terça-feira, 18 de novembro de 2008

Ana e o Mar - Capítulo Especial - A Ilha dos Pensamentos

À seu Romério, que me ajudou bastante.



-

O palhaço se sentou em frente à pessoa que precisava.

- Como é seu nome?

- Augusto [ainda pensou em dizer ‘Joakim’].

- E o do senhor?

- Romério.

- Ai vida difícil...

- O que foi, rapaz?

- Ah, problemas do coração.

O senhor ficou encarando-o, enquanto marretava a bigorna do martelo que estava construindo.

- Mas você é tão novo, rapaz. Qual tua idade?

- 17.

O senhor abriu um sorriso.

- Eu tenho um filho da tua idade, e sempre que posso, aconselho ele. Olhe, vou lhe contar uma estória, chama-se ‘A Ilha dos Pensamentos’.



Havia uma ilha distante, onde viviam todos os pensamentos. Nela, vivia o amor, a tristeza, o rancor, o tempo, o ódio, a raiva, a alegria, a emoção, a razão, o bem, o mal, a saudade, a lembrança, a fé, a crença, a ilusão, a vida, o vazio, o romance; enfim, todos os sentimentos que podem existir.
Um dia, nessa ilha começou a chover, e a mesma estava ficando submersa e, com ela, todos os sentimentos estavam morrendo. Sendo que aconteceu de um deles querer salvar todos os outros que estavam se afogando. Amor começou a pegar um por um e colocar nos botes que haviam na ilha. Colocou o tempo, a tristeza, a alegria, o rancor, a saudade, todos eles, sendo que, ao olhar pros lados, viu que não haviam sobrado nem um bote no qual ele pudesse se salvar. Então, quando estava se afogando e quase desmaiando, sentiu uma mão lhe puxar pelo braço, mas não pôde ver quem era, e desmaiou antes disso.
Quando acordou, já em terra, foi perguntar quem o tinha salvado, mas parecia que não encontraria.

- Tristeza, foi você quem me salvou?

- Não.

- Saudade, foi você quem me salvou?

- Não.

- Fé, foi você quem me salvou?

- Não.

Parece que ele já tinha perdido a esperança de procurar, até que, enfim, encontrou quem o havia salvo.

- Tempo, foi você que me salvou?

- Foi sim.

- Mas porque , entre todos, foste o único a me salvar?

- Só o tempo pode salvar o amor. Nenhuma dor é maior que a perda do amor, ou de um amor, de forma que só eu posso ajudá-lo.

[...]


O palhaço estava com os olhos lacrimejando, lágrimas que não vinham dos seus trocadilhos, nem da sua máscara. E o senhor continuou:

- Olhe, tudo o que você quer pode acontecer, mas primeiro você deve ter três coisas.

Nessa hora, um amigo de seu Romério tinha se sentado do lado, mas logo saiu. Só então, ele pôde perguntar:

- E quais são essas três coisas?

- Eu vou lhe dizer. Primeiro você precisa ter fé, acreditar que o que você quer vai acontecer. Quando se acredita, se pode tudo, rapaz, tudo.

Ele ficou cabisbaixo, às vezes olhando para seu Romério com o olho meio torto.

- Segundo, você tem que retirar todas as mágoas do seu coração. Todas as pessoas que lhe fizeram guardar esse rancor, retire essas partes ruins de si, jogue fora tudo de ruim que estiver aí dentro, porque, pra que uma coisa boa aconteça, nada de mal pode estar guardado. Jogue fora, deixe o orgulho de lado, e seja feliz.

Uma pausa gigante foi dada.

- A terceira coisa é a mais difícil. Chama-se P-A-C-I-Ê-N-C-I-A. Sem ela, nada do que você quer acontece. Pode durar mil anos, mas se você estiver com essas três coisas, tudo o que você quiser vai acontecer. Tudo.

E conversaram ainda mais, e o palhaço saiu satisfeito. Pesado, mas satisfeito.



-



na Fazenda do Sol, em 16 de Novembro de 2008.

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